Sunday, 1 June 2008

"as palavras é só bolinhas de sabão"



Terrina


Friday, 30 May 2008

Fio

Como um fio de seda que balança ao sabor do vento e das gotas de chuva que quase o partem. Frágil e resistente ao mesmo tempo. Vai e vem, roda, gira e torçe. Não parte. Estica e encolhe, desenrola e volta a enrolar qual novelo colorido.

Fio ponte com gente nas pontas... Ou talvez não. Fio ponte com gente mais que gente nas pontas.

Wednesday, 28 May 2008

Cerejas

Muitas vezes ouvi a canção. Dizia a voz que a vida é feita de pequenos nadas. É! E depois esses nadas bem pequenos fazem um todo até com bastante graça.

E do meio do nada aparecem palavras que não deixam esquecer o que sempre se soube, a normalidade é sempre um bocado relativa e sabe bem acordar com as unhas pintadas de vermelho e revirar os olhos e ir só porque sim.

E as pessoas humanas pouco percebem dos pequenos nadas. Porque as pessoas humanas sabem muito pouco. Nem descobriram ainda que se pode ver o sol nascer...

Wednesday, 21 May 2008

Bom dia

Perdi-me enquanto deambulava. Deixei-me andar sem ver para onde ia, deixei-me ir ora virando à esquerda, ora à direita. Cansei-me e adormeci. Acho que adormeci.

Acordei agora, mas não sei onde estou... De qualquer modo também não tenho a certeza de querer voltar...

Monday, 19 May 2008

Impossível?

Saturday, 17 May 2008

Campos

E depois é estranho demais sonhar com campos de girassois. Mais estranho é acordar e o silêncio dominar a vontade.

E é nessas alturas em que queria ter-te ao lado para te acordar com um bom dia e um beijo. É nessas alturas em que sinto coisas confusas que deixo de saber sentir.

E do resto que falem os entendidos...

Thursday, 15 May 2008

Luas

Reparo agora ao olhar para o céu que quase cinco luas passaram. E cinco luas depois, encalhado no tempo, pergunto-me no que pensarei daqui a duas mais. Se calhar é de mim, ou então as marés passaram a encher e a vazar um pouco mais depressa.

Vi ontem um monte de ossos, carne e tendões. Vi ontem tudo isso feito pé. Um pé lego. Peça a peça, da maior à mais pequena, tudo junto e bem ligado.

E vi gente a tentar sair da fila, mas sem primeiro aprender a caminhar fora dela. Cairam e eu ri só porque sim.

Sei sim que o pé jamais será pé, mesmo com todas as peças bem montadas, sei que nem todos serão capazes de dar o salto e ficar de pé e sei que daqui a duas luas, numa noite bem amarela, poderei voltar a contá-las do zero.

Wednesday, 14 May 2008

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Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.

O ar que respiro, este licor que bebo
Pertencem a meu modo de existir,
E eu nunca sei como hei-de concluir
As sensações que a meu pesar concebo.

Nem nunca, propriamente, reparei
Se na verdade sinto o que sinto. Eu
Serei tal qual pareço em mim? serei

Tal qual me julgo verdadeiramente?
Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu,
Nem sei bem se sou eu quem em mim sente.

Álvaro de Campos

Tuesday, 13 May 2008

Changes

Era simples demais quando quase chovia. Umas gotinhas de água aqui e ali, a refrescar o ser. Meia dúzia de núvens acinzentadas a tapar o azul que logo depois haveria de voltar a brilhar.


Mas depois as núvens deixaram de ser só cinzentas e passaram a ser negras. Em vez de quase chover, choveu mesmo. Tanto, tanto... Ficaram inundadas as casas e as ruas deixaram de se ver, assim como o azul azul que dantes feria os olhos.

Mudou o tempo sem avisar. E eu que me recuso a andar de guarda chuva...

Wednesday, 7 May 2008

Rodas

Pode não ser mau chorar, é até muito bom quando a lágrima corre pela linha do sorriso mais aberto que nunca. E depois perceber que o que tantas vezes se diz é tão verdade quanto o que se sente.

A distância como um fio de elástico que estica e encolhe à força da vontade e do querer. Porque descobri um dia que não há longe nem distância, que os metros são o que quisermos fazer deles e nada vale a pena se não se sentir um bocadinho.

O resto da história é simples. Porque a tangerina é bem pequena... E agora voltei a encontrar quem julgava ter perdido há uns pares de meses. Eu!

Sunday, 20 April 2008

Bancos

Simples demais para poder ser complicado. Talvez complicado demais para poder ser simples, sei lá. Como na canção...

E mesmo que só a fazer de conta, os bancos nunca estão vazios. Os do carro, os da alma, os da esquina e os que guardam o dinheiro.

Sunday, 13 April 2008

Ecos

"Também eu..."

(Se calhar era mentira, se calhar é verdade. Já não conto ter tempo para descobrir. Nem sempre se pode saber tudo...)

Wednesday, 9 April 2008

Voltas

Era uma vez uma aldeia. Essa aldeia, como todas as aldeias, tinha casas e ruas e estradas e jardins e praças e todas as coisas que as aldeias têm.

Tudo isto seria nada, se a aldeia não fosse uma aldeia especial. Para além de todas as casas serem côr-de-rosa -como todas as nossas estradas sao pretas-, havia apenas uma lei a cumprir. Todos os habitantes, sem excepção, teriam de sorrir. Ora aquilo era muito estranho para quem por lá passava de caminho para um qualquer outro lado.

Certo dia, durante um funeral, um forasteiro ao presenciar a cena, perguntou à viúva mais sorridente que tinha conhecido na vida a razão de tanta alegria. "Mas nós estamos tristes! Não percebo a pergunta...", respondeu Margarida, ostentando o mais belo sorriso que herdara dos seus pais. Na verdade, atrás dos sorrisos estendidos de orelha a orelha, escondiam-se dores e amarguras, desgostos e frustrações...

Herminio, o forasteiro, deixou-se ficar. Margarida, ao voltar para a sua casa côr-de-rosa encontrou-o sentado num qualquer banco de jardim. Não sorria. Então o sorriso?", perguntou, "Não conhece a lei? Aqui, todos temos de sorrir. Sempre, sempre, sempre...". Herminio soltou um "não me apetece". Margarida pegou-lhe na mão e levou-o para casa. Ai finalmente deu descanso às bochechas e suspirou "a mim também não...".

Perderam-se nas horas por entre palavras e chávenas de chá. Amanheceu e Herminio partiu para voltar poucos dias depois. Trazia na mão um saco e uma lata. Margarida sorriu, de verdade e por dentro, ao ver tal figura abrir o portão. Não havia tempo a perder. Pegaram na lata e pintaram a casa de preto perante o espanto geral da multidão sorridente que se ia juntando no meio da rua. "A partir de hoje", disse Margarida, "hei-de sorrir só quando me apetecer, a partir de hoje a minha casa será negra. Negra. Porque sim...".

Nem Margarida sabia o que tinha feito. Aos poucos, as casas foram mudando de côr na aldeia e os sorrisos desaparecendo das caras. Dois meses depois não restava uma única casa côr-de-rosa e os raros viajantes e por lá passavam estranhavam ver tanta sisudez nos rostos.

Herminio e Margarida, agora que se tinham encontrado, viviam felizes na casa negra ao fundo da rua. No canto em que havia somente terra plantaram um jardim onde se deitavam ao sol e riam horas sem fim.

Numa manhã de chuva, Herminio partiu novamente para de novo voltar poucos dias depois. Desta vez trazia só uma lata na mão. Ficou feliz, Margarida, quando o viu chegar, tão longa tinha sido a espera. Pintaram a casa de côr-de-rosa num dia de sol enquanto se riam de todos os outros que nunca souberam sorrir de verdade...

Tuesday, 8 April 2008

Um pouco quase muito

Eu gosto quando chove. Gosto quando chove e molho os pés na água fria. E gosto quando o vento parte os chapéus de chuva das pessoas que andam com chapéus de chuva.

E passo na rua e olho de lado quem de lado me olha.

E sinto.

E gosto quando a chuva quase molha, em dias quase perfeitos. Quase... Faltou qualquer coisa na mão estendida.

Wednesday, 2 April 2008

Núvens

Viajavam em suaves nuvens de algodão doce. Durante as viagens, maiores que o próprio tempo, falavam de mundos e lugares e vidas e sonhos e tudo e nada. E riam com a única certeza de que nada mais existe senão, o agora que era só deles. Riam tanto por tão pouco.

Quando caia a noite e o azul do céu lentamente se ia transformando noutra côr, talvez mil e uma, pensavam em descer e logo desenhavam o minucioso plano de aterragem. O cálculo ao segundo, ao milimetro...

Depois, quando chegava a hora certa, e tudo apontava para que descesssem, deixavam-se ficar a ver as soturnas pessoas que lentamente se arrastavam um pouco mais abaixo deles. Tão pequenas lá em baixo.

Comiam bocadinhos pequenos de núvem mágica enquanto desciam só porque sim. Fora de horas e longe do lugar onde o tinham pensado fazer. Ao chegar ao chão olhavam um para o outro e diziam baixinho ao ouvido: "Havemos de voltar!". E voltavam, e voltaram até em dias quase sem núvens. Mas aquelas eram mais que nuvens, como eles eram mais que gente.